Segundo Nelson Rodrigues, a derrota do Brasil para o Uruguai em 1950 criou no brasileiro um “complexo de vira latas”: a incompetência dos campos transbordou as quatro linhas e grudou em todos os aspectos da vida cotidiana. A partir daí, nada adiantava, se tivesse um brasileiro no meio de qualquer coisa, iria sair malfeito, seria desonesto e muito provavelmente não funcionaria.
Não sei se esse complexo nasceu mesmo em um jogo. De verdade, acho pouco provável que uma partida tenha tamanho poder. Mas é certo que há no país um orgulho às avessas (para não falar vergonha) em ser brasileiro. É uma sentimento latente, que fica ali guardado e que precisa de pouca coisa para aflorar.
E ele veio com tudo nesse ano, pois a Copa nos colocou defronte ao espelho. Ela nos expôs ao julgamento do mundo e não apenas em termos desportivos. Nossa infraestrutura, nossa educação, nossa receptividade, nosso preparo profissional, etc… tudo está sob avaliação. Ao final, nós nos veremos através das lentes da imprensa estrangeira e do olhar gringo e quando a Copa acabar, faremos um balanço não apenas da seleção, mas também do país.
De uma maneira geral, sempre nos foi vendido que eventos tal como a Copa e as Olimpíadas eram privilégios de países ricos e desenvolvidos. Por isso, há sete anos atrás, quando o Brasil foi anunciado o país da Copa, nos vimos esperançosos de que, quando 2014 chegasse, estivéssemos no mesmo nível das sedes anteriores
No entanto, muitas falhas de planejamento e de execução aconteceram. Tivemos tantos problemas que não foram poucas as pessoas que disseram que demos um passo maior do que as pernas, que a Fifa transferiria o Mundial para outro país na véspera, que o caos aéreo e terrestre transformariam o Brasil em uma piada internacional.
Hoje, na metade do mundial, não há caos. As falhas estão aí, atrapalharam e foram noticiadas mas, no geral, tudo está correndo bem, a nossa infraestrutura está suportando a demanda e os estrangeiros estão falando bem da gente. Acho que estamos bem próximos de dizer: conseguimos! A verdade não está nem tanto ao mar, nem tanto à terra: não somos menos capazes do que ninguém. Mas também não temos razões para sermos ufanistas, pois não somos a civilização mais avançada do século XXI.
Certa vez escutei que bons países são aqueles que sabem identificar e resolver seus problemas. Nesse sentido, toda discussão trazida pela Copa está mostrando que o brasileiro está longe de estar satisfeito consigo mesmo e que está fazendo força para mudar. De coração, eu não espero que o mundo saia daqui achando que temos os melhores estádios, aeroportos e até mesmo o melhor futebol do universo.
O que eu espero e desejo é que os nossos visitantes deixem o Brasil com a certeza de este é um país que tem seus problemas mas que tem muito comprometimento para solucioná-los. Que o legado da Copa venha na forma de força e consciência para continuarmos seguindo em frente sem falsos complexos nem ilusões desmedidas.
Mauro Silva
Presidente da Fundação Republicana Brasileira